Pois bem, resolvi trazer para a Shiny algumas de minhas curtas e One-Shots. Espero que gostem! o/
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Sem você
Naquela peça fria e vazia, atirado sob chão gelado, incapacitado de qualquer movimento. Sem forças ou reação alguma para suportar tal perda... Apenas a fraca luz da janela ilumina o homem franzino que não consegue lidar com sua dor e revela alguns detalhes daquele local mórbido em que o mesmo estava jogado. O chão de madeira sujo deixava claro que o sujeito não se importava em estar em algo asseado, sensação essa aumentada pela cama desarrumada e, nela, livros jogados.
Embora a perda de alguém tão querido o houvesse abatido, o sofredor em decadência negava aquilo com todas as suas forças... Poderia se tratar apenas de um pesadelo, ilusão ou algo que não havia realmente ocorrido... Chocado e destruído, não aceitara a ida de seu amigo e forçava sua mente a acreditar que o mesmo estivera aqui. Carregava consigo um velho porta-retratos, enquanto, encolhido e chorando compulsivamente, levava esse para perto do rosto, fazendo questão de derramar suas sinceras lágrimas nele.
Ele se foi e não havia jeito de trazê-lo de volta.
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Aquilo que não posso conter...
Não há maneira de suportar o sentimento de que algo falta para você, estar vivendo uma vida de incômodos, confrontar-se constantemente com a mulher que dizias amar para sempre, por motivos bobos muitas vezes. Pior que isso, ver que a beleza juvenil que outrora lhe atraiu converteu-se naquela infeliz que vive comigo atualmente.
Por fim, decidi tomar uma drástica atitude que mudaria completamente o triste estado em que me encontrava e, talvez, mandasse todas essas decepções embora. Tomei um rumo que não me é costumeiro pela noite, atraído pelo habitat daqueles infelizes que vagavam ao escurecer. Talvez eles estivessem tão cansados de suas vidas quanto eu... Entendo que, nesse caso, percam totalmente sua razão ao ver aquela que é a habitação das garotas dos sonhos de qualquer um, fato esse mostrado pela imagem brilhante na entrada, uma mulher feita por luzes vermelhas. Ah, essa visão... Não havia como escapar do prazer pecaminoso ao vê-la. Pensando bem, eu o queria. Decidi ir mais adiante e ver o interior daquele lugar.
Não deveria ter feito isso. Mergulhei profundamente naquelele inferno e senti minhas fracas pernas tremerem enquanto fixava o olhar à uma determinada dançarina. O corpo, seus olhos... Parecia, apenas com seus doces movimentos e lançar um sorriso que fez tremer minha alma, mostrar-me que ainda havia mais por lá. Ela é linda... No fundo, apenas alimenta-se da droga do sofrimento dos homens e sua fraqueza por um corpo belo e escultural como o seu, querendo a droga do seu dinheiro. Os laços de meu casamento tornaram-se naquele momento correntes que me prendiam ao chão e não deixavam-me chegar mais perto. Não entraria ali e esconderia-me como o covarde que sempre fui mas, mesmo naquele estado deprimente, sinto pelo remorso de trair minha esposa que ainda a amo.
Apenas uma noite... Perdoe-me se eu fraquejar dessa vez, quero apenas reconquistar o pouco que você um dia já me deu, amor...
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Sofredor
Jordan observava quieto seu quarto desarrumado, estático, enquanto tinha sua visão focada em um livro empoeirado e caído sobre o chão de madeira sujo. Havia despertado para mais um dia desinteressante, maneira como o mesmo encarava sua rotina. O relógio no criado-mudo ao lado de sua cama marcava que haveria de se levantar naquele momento, fato esse fortemente reforçado pela luz do Sol entrando levemente pela janela e iluminando aquele pacato local, dando sinais de que um novo dia começara. Espreguiçava-se, fazendo o velho lençol que estava preso ao colchão desgastado soltar-se, enquanto o barulho de madeira característico de sua cama ecoava pelo local. Aparentava sono e cansaço em seu olhar enquanto colocava seus pés descalços no chão de seu quarto quando, claramente, se mostrava mal humorado. Parecia preso à cama e lá queria permanecer pelo resto do dia. Pelo resto de sua insignificante vida...
Olhar pela janela e ver a cidade clara e iluminada apenas fez seu humor piorar. Deu um murro de raiva na parede ao observar que, como em um dia comum, notava estudantes distraídos passando com suas diferentes mochilas para seu período na escola, enfrentando dificuldades da chuvosa noite anterior. A rua não asfaltada estava coberta por vastas poças d'água que obrigavam alguns mais cuidadosos a usarem calçados velhos. O dia claro e o céu brilhante, azul e sem nuvens davam a entender que o mesmo não iria ocorrer naquela calma manhã de quinta-feira.
Detestava aquilo a ponto de cogitar fazer algum tipo de bruxaria para ver aquela chuva torrencial de outrora... Não parecia estar muito feliz de ter que ir ao seu guarda-roupas com apenas metade das gavetas disponíveis... A falta das restantes demonstrava que aquele jovem de classe média-baixa não tinha altos poderes aquisitivos, como o longo tempo em que o objeto já estava presente ali: sujo, desgastado, com apenas o uniforme escolar em seu interior. Apenas possuía uma muda de roupas, não contando a que o sujeito estava vestindo.
Isso, de certa forma, não incomodava o adolescente de maneira considerável. Estava acostumado com condições não tão favoráveis. Seus monstros eram outros e espantá-los parecia algo impossível. Daria de cara com seus medos em poucos minutos enquanto, receoso, olhava ao relógio e rezava interiormente para o tempo arrastar-se. Simultaneamente, vestia-se a roupa que teria de usar em alguns instantes.
Quieto, desatento, tímido e desengonçado eram as melhores maneiras de definir o menino de pele pálida que, após vestido, arrumava seu cabelo crespo, comprido e desorganizado, colocando esse de maneira que não parecesse ficar tão volumoso e não dar o ar de desarrumado.
Pensava em sua vida enquanto deixava seu quarto rumo ao banheiro, peça ao lado. Antecipava o sofrimento da escola, tocando as escoriações em seu frágil rosto com mãos trêmulas e amedrontado pela ameaça costumeira. Sim, era uma vítima dos típicos valentões de todo o local desde dois anos atrás. Por se tratar de um caso único de exclusão no ambiente escolar, não muita atenção era dada ao jovem... As palavras da direção, mandando-o se enturmar como se fosse a coisa mais fácil do mundo soavam como ironia. Afinal, não era de seu perfil ser ''descolado''. Sofrera as consequências disso na pele enquanto todos repetiam aquele discurso clichê que não o ajudava em nada. O maior problema não era a falta de tentativas, sim a falta de resultados.
Consideraram levar Jordan a um psicólogo. Nessa sociedade padronizada, se não és como todos, o problema está obviamente contigo. Esse pensamento que aqueles malditos trabalhadores da escola deram à família do garoto, implantando essa imagem do mesmo na cabeça deles. Afinal, se TODOS caçoavam, o problema não haveria de estar com a esmagadora maioria. Consideraram deficiência mental ou a Síndrome de Asperger, descartados por diagnósticos futuros.
Já haveria de ter se suicidado se não fosse pela internet... Ah, se não tivera ela a seu alcance! Alimentava sua destruída alma de centenas de gozações que soltava pela web, inspirado na imagem de seus agressores na vida real. Por consequência, tornou-se um ''troll'' de primeira, lapidado pelo que sofrera e queria que outros sentissem na pele. O respeito que conseguira em um portal sobre algum cantor na web o fazia ter a falsa impressão de que era alguém melhor do que um escurraçado e jogado ao lixo pela sociedade. Ao menos, em algum lugar, o mesmo tinha respeito.
Chegando naquele pequeno espaço que chamava de banheiro, direcionava seu olhar para a parede rachada e sem esperanças de reforma, junto a um antigo chuveiro ligado a si. O mal odor também era costumeiro naquele local em que o vaso sanitário era imundo e as torneiras não jorravam mais a água, já que a mesma houvera sido cortada. Apenas observava sua face triste e oprimida no espelho enquanto escova seus dentes, esses bem cuidados, cuspindo o creme que saía de sua boca naquele momento na pia quase inútil.
Saiu de lá em direção a porta de entrada de sua moradia, enferrujada, abrindo-a e dando de cara com um brilhante e desagradável dia claro. Seu cenário de terror.