Primeiro capítulo de SE, espero que gostem. Trabalhando bastante na história. Comentem!
- I – Sombra e realidade vs. Luz e ficção -
- Acorda mamãe. – com extrema insistência, eu tentava fazê-la despertar. – Por favor, acorda! – ao tentar levantá-la, um líquido quente e viscoso encharcou minhas mãos. Não sabia o que era aquilo. Era impossível ver nesta noite sem luar, a escuridão impedia enxergar um palmo a minha frente. – Pai. Cadê você? Me ajuda. A mamãe... A ma... – segurando as lágrimas e envolto às sombras da noite, a realidade começava a me afetar. – Ela... A mamãe não acorda.
Eu continuei a chamá-lo, mas sem sair de perto dela. O tempo passou feito uma eternidade aterrorizante até faróis surgirem iluminando o matagal próximo ao riacho. A neblina branca e emblemática sobrevoava o lago onde havia algo boiando. Os grilos chiavam irritantemente mantendo o fio de sanidade em minha mente aceso.
Eu tremia pelo clima frio daquela noite. Grudado ao corpo estranhamente gélido de minha mãe, a sensação frígida aumentava exponencialmente. Ela sempre fora tão quentinha e acolhedora, afagando meus cabelos antes de eu finalmente dormir. Eu sabia. Algo estava errado, mesmo assim eu iria permanecer até tudo se normalizar. Não me afastaria dela enquanto ela não me desse um abraço e um beijo, como sempre fazia quando eu tinha medo. A escuridão, eu morria de medo do escuro, mas nessa noite meu maior medo era outro. Meus pais, eu queria eles comigo. Não queria perdê-los de jeito nenhum.
Alguém se aproximava, eu percebi pelo barulho da grama alta estar mais perceptível.
- Meu Deus. – a voz era de uma mulher.
- Me ajuda. – gritei desesperado. – Minha mãe não acorda, e o papai... O papai sumiu.
- Tem uma criança! – a mulher mirou a luz fraca da tela do celular em minha direção. – Vem aqui vem.
- A mamãe. – abracei seu corpo com força.
- A gente vai tirar ela também. – a mulher tentou puxar meu braço, mas me encolhi para longe dela.
- Não. – o medo de não estar mais com a minha mãe era terrível. Não conseguia me afastar.
- Tem um menino aqui, vó. Ele não quer sair. – a voz da mulher saiu esbaforida.
- Melhor esperar o socorro chegar. – outra pessoa respondeu. – Achei a lanterna. Vou jogar.
- Tá! – a mulher se afastou, mas logo voltou jogando uma forte claridade sobre o meu rosto, cegando-me. – Ah! – o grito horrorizado da mulher me fez acordar do pesadelo.
***
- E ai mãe? – dei um forte abraço de bom dia.
- Oi meu garoto. – ela lançou um sorriso em recompensa a meu gesto amável. – Primeiro dia de aula na escola nova. Fico contente em te ver tão animado.
- Mais que a obrigação. – mordiscando um biscoito de água e sal, minha adorável irmã mais nova emanava sutileza de seu sarcasmo.
- Claro, né! – ignorei-a completamente e sentei a mesa misturando o leite frio ao café fumegante. – Jamais pensei ir pro C. A., ainda mais do jeito que foi.
O C. A., Centro Acadêmico Vilas Boas, é um colégio idealizado por um milionário idealista, nascido aqui em Uberlândia. Referência em educação a nível mundial, o C. A. recruta alunos de diversas nacionalidades empregando diferentes métodos de seleção. Os que podem pagar ou possuem influência política garantem suas vagas, embora haja as bolsas de estudo para pessoas como eu. Através de testes variados, são selecionados adolescentes que se destacam nestas avaliações. No meu caso, pela entrevista eu acabei passando.
- Estou orgulhosa por você conseguir entrar em uma das melhores escolas com uma bolsa de estudos, mesmo desse jeito viu. – ela mordeu a barra de cereais enquanto lia uma revista de moda.
Todo dia de madrugada, minha mãe levantava pra ir correr envolta do Parque do Sabiá, e ainda tinha disposição pra ir à academia, tudo isso antes de ir trabalhar.
- Vou me arrumar. – ela colocou o copo na pia e jogou a embalagem da barra de cereal no lixo. – Daqui a pouco eu desço pra te levar.
- Tá bom. – abri o pacote de bolacha recheada e molhei na mistura de café com leite. A bolacha derreteu em minha língua com um gosto de café.
Bocejei meio desajeitado. Iria demorar a ter o costume de levantar cedo. Geralmente eu levantava pelas dez da manhã. Ficava acordado noites a fio com frequência, o vício pela internet não me largava, ou o contrário.
- Bom dia! Lucas é hoje. – meu pai desceu as escadas já me felicitando.
- Pois é. – disse meio sonolento e mudando de assunto. – E você terminou o projeto daquele novo restaurante do shopping?
- Ainda tenho uns detalhes pra decidir com o proprietário, fora isso tá tudo certo. – ele sentou-se do meu lado, já colocando café na xícara. – Como vai minha filhinha?
- Ótima pai. – o papai sempre foi à única pessoa ao qual minha irmã era gentil.
- Estou doido pra ir nele. – meus amigos ficavam me enchendo de perguntas sobre quando ia ser a inauguração. Aproveitando que minha espinhenta irmãzinha estava solicita a aproximações, decidi me retratar. Ultimamente não tenho tratado ela muito bem. – Annelise, mesmo que não acredite, eu quero ver você no C. A. Se eu consegui...
- Pelo menos você sabe. – ela nem esperou eu terminar. – Eu não acredito que ia falar isso. Se for assim é mais idiota do que eu pensei.
- Hum. – meu pai sorriu, enquanto ela deixou a mesa e subiu pela escada.
Mesmo ela sendo inoportuna e esnobe, a Annelise acreditava em meu potencial, mesmo quando eu negava e persistia em fracassar. Terminei de comer em companhia do meu pai e então subi para escovar os dentes. Peguei a mochila e o DS lite e deitei no sofá da sala para jogar os desafios do dia do “Brain Age”, enquanto minha mãe terminava de se arrumar.
- Sônia já estou indo, amor. Boa sorte, filho. – meu pai acenou se despedindo. Pegou as chaves do carro e saiu para a garagem.
- Me espera pai. – a Annelise correu até a garagem lançando um beijo de despedida para mim.
Alguns minutos depois, minha mãe desceu vestida com um terno preto bem alinhado ao corpo, o cabelo com mechas loiras nas pontas, estava linda como sempre. Recentemente, ela fora promovida a gerente sênior dentro de uma multinacional e ficara ainda mais vaidosa. E devido ao aumento considerável em nosso orçamento, planejávamos nossa primeira viagem internacional para as férias de fim de ano, provavelmente um tour pela Europa.
- Vamos? – ela chacoalhou as chaves na mão.
- Sim. – levantei do sofá sem tirar a atenção do desafio de calcular as sentenças matemáticas.
- Aproveita e pega essas contas ai, Lucas. – ela apontou para a gaveta e saiu para a garagem, o rugido do motor já soando.
Abri a gaveta e peguei um chumaço de papéis e sai pela porta da frente, entrando no carro.
- Você está levando o cartão? – tirei do bolso a carteira para me certificar. Sem ele seria barrado na porta do C. A.
- Tudo certo. – terminei os desafios do dia e decidi guardar o console. Peguei meu Ipod, selecionando a playlist de músicas pop e relaxei no banco do carro observando o trânsito a cada dia mais parecido com de grandes centros, como São Paulo e Belo Horizonte.
Seguimos até a Rondon Pacheco, parando na porta principal do C. A., um enorme galpão, ocupando o quarteirão inteiro repleto de árvores ao redor. Esperava um tráfico constante de carros com os pais levando os filhos, mas a maioria dos estudantes vinha andando ou montados à bicicletas, desde cedo adquirindo independência.
- Boa sorte. – eu desci do carro ajeitando a mochila e agradecendo o apoio.
- Valeu mãe. – acenei e me dirigi à portaria, passando meu cartão na catraca.
Caminhei até a recepção procurando algum conhecido.
- Nada. - envergonhado por ser o primeiro dia e não conhecer ninguém, comecei a me remoer em ansiedade. Eu no último ano mudando para um colégio cheio de pessoas ao qual não pertenciam ao meu grupo social e sem perspectivas de conseguir me interagir bem com pessoas acostumadas com extremo luxo. Pensei em meus amigos, todos aproveitando as férias, e eu já começando as aulas. Um saco.
Enquanto eu divagava, muitos conversavam tranquilamente na recepção, cumprimentavam conhecidos ou zoavam com os amigos.
- Hugo, é verdade mesmo o que estão falando? – sentado a beira da escada, o garoto repousava a cabeça sob os joelhos enquanto o outro falava sem parar.
- O que? – ele fez careta ao se levantar.
- Você foi convidado pra treinar nas categorias de base do Flamengo e nem falou nada pra gente. – ele socou o ombro do garoto falastrão e me encarou.
- Dá um tempo viu. – a ofensiva forte dele me desatou. Ele era ameaçador e pouco amistoso. Pura encrenca.
Procurando me desviar de um possível desafeto, fingi estar atrás de algum funcionário para ver se conseguia informação e acabei trombando em um garoto de olhar curioso.
- Foi mal. – sorri sem graça.
- Sem grilo. – ele coçou o queixo e apontou para um aglomerado. – É novo aqui, né?
- Sou sim. – o garoto falava em tom baixíssimo, escondendo-se por trás de seus óculos.
- Seu nome... – ele pegou um caderno e começou a rabiscar algo. – Hum, posso fazer, quem sabe...
- Lucas. – imediatamente ele parou o que estava fazendo.
- Aqui. – ele arrancou a folha e me entregou. – O único Lucas da lista é você. Então... Hehehe! – ele coçou o queixo novamente. – Sou Iann, mas me chame de Cooper, certo.
- Tá. – ele parecia fora do ar.
- Ah! Sala 3-B, lá em cima viu. – Iann apontou para o teto. – Você é da minha sala. Seremos colegas, legal né, hehehe!
Mesmo pelo o que o Iann disse, achei melhor me certificar. Talvez fosse um trote de veteranos pra fazer os novatos pagarem mico. E o jeito dele também não me parecia nada confiável. O papel que ele me entregou, tinha dois bonequinhos desenhados toscamente. Uma criança pequena desenharia melhor que aquilo.
Vi o mural com as listas das salas e resolvi enfrentar a multidão de alunos. Com muito custo, consegui vencer esta barreira apenas para confirmar a informação que se provou verdadeira.
Subi as escadas até chegar ao bloco B. Encontrei a sala 3 e entrei sem cerimônias.
Havia algumas pessoas, no entanto nem ligaram para a minha presença. Me senti acuado ao ver sentado na primeira carteira o garoto que me encarou. Estava novamente de papo com seu amigo e continuavam a conversar mesmo após a pequena desavença.
- E ai Lucas! – no fundo, Iann me gritou escorado com os pés sob a carteira. – Senta aqui, hehehe.
- Hum, valeu. – sentei na fileira ao lado pegando o notebook que ganhei de presente para poder estudar.
- Nunca te vi aqui. – Iann falou distraidamente. – É novo aqui, né?
Ele já tinha me dito isso, mas preferi ficar calado.
- Pois é. No último ano que consegui entrar. – na tela inicial do notebook mostrou sinal para internet. – Aqui pega sinal?
- Claro, ué. – Iann coçou o queixo falando como se internet dentro de uma escola fosse normal, embora no momento estivesse absorto na garota que acabara de entrar.
Cabelos loiros, olhos verdes, roupas estilosas, gata demais.
- A Fel tá um espetáculo, hehehe! – Iann cruzou os braços por cima da cabeça, piscando para ela. – Ela fica mais gostosa a cada dia que passa. – cochichou, permitindo somente a mim ouvir.
Sorri sem jeito. A menina estava perto e ele falando isso.
- Oi Cooper. – ela acenou de volta. – E você? – pela aproximação da garota eu acabei sentindo seu perfume doce e comecei a espirrar. – Quem... hã, é?
- Desculpa, atchim! – me senti um idiota espirrando sem parar. – Lucas, atchim.
- Sou a representante, e por isso tenho a responsabilidade de te mostrar o C. A. – ela sorriu, escondendo o riso. – Felícia, mas todos me chamam de Fel.
- Assim eu fico com ciúmes, hehehe! – Felícia bagunçou o cabelo já despenteado do Iann, deixando-o feito um espantalho.
- Sem chances garoto. – ela colocou a mochila na carteira a frente da dele. – Lucas qualquer coisa é só falar comigo viu.
- Tá bem. – enfim parara de espirrar e pudera falar normalmente.
- Pode falar agora. – a garota intimou Iann ao apertar seu pescoço. – Pra você tá andando com o Cooper, alguma coisa aconteceu. – ela virou pra mim ameaçadoramente.
- O que, por exemplo? – afastei as mãos por instinto de defesa.
Ela começou a rir.
- O que tem de bom na net hoje? – Felícia falou descontraidamente.
- Caiu direitinho. – Iann a cumprimentou. – Melhor impossível.
- O que? Mas o que? – estranhei a mudança repentina.
- Relaxa, só gostamos de brincar um pouco. – ela me deu um beijo na bochecha e provocou o Iann.
- Então não é nada demais... – nunca estive tão perto de uma garota tão linda como ela. Além disso, tinha um jeito meio insano e divertido. Tinha certeza que eu estava vermelho.
- Olha a cara dele, hehehe! – O Iann riu e começou a fuçar pelo meu notebook, sem ao menos pedir permissão.
Escondi o rosto por trás do notebook, dando uma cotovelada de advertência no Iann.
- Hã? – A Felícia estava distraída e nem notou.
- Um vídeo no youtube. – desconversei.
- Então Lucas, mora onde? – Felícia olhava disfarçadamente para o garoto da primeira carteira.
- Umuarama, perto da UFU. – disse desconcertado.
- Você é bolsista, então. – ela voltou sua atenção para mim. – Eu sou carioca, mas moro aqui durante as aulas no mesmo prédio que esse aí. – ela apontou para o Iann. – E também a Renata. Aquela lá. – Renata tinha o cabelo curto e vermelho, e estava conversando com outras meninas. – Moramos juntas.
- Legal. – o professor finalmente chegara interrompendo nosso papo e então as aulas começaram firmes, sem as comuns enrolações de início de ano.
***
No intervalo, a Felícia e o Iann foram me mostrar à biblioteca.
- Os alunos não são obrigados a assistir as aulas, mas precisam desenvolver projetos paralelos caso escolham essa alternativa. – a Felícia folheou alguns livros da estante de literatura estrangeira. – Como sabe as aulas são em período integral. As matérias básicas são todas dadas pela manhã caso queira prestar vestibular ou ter o mínimo de conhecimento.
- Deixa desse papo. – o Iann rabiscou um bigode em uma menina do pôster. – Vamos comer alguma coisa.
- Se quiser... – ela guardou o livro de volta.
- Fala mais. – disse meio receoso de irritar o Iann.
Ela sorriu e sinalizou um cai fora para o Iann.
- Vejo vocês depois. – ele caminhou desengonçadamente, cantarolando alto. – Para... Para... Paradise.
- Ele não tem conserto. – Felícia me ofereceu uma bala de menta enquanto continuávamos a percorrer a biblioteca.
- Shhh! – uma garota de atitude imperiosa pediu por silêncio. Ela parecia realmente concentrada em sua leitura.
Seu rosto e corpo marcantes me chamaram a atenção. O cabelo preto na altura dos ombros, olhos azuis, as maçãs do rosto vívidas e rosadas, de corpo esguio e delicado. Poderia facilmente ser uma modelo se quisesse.
- Melhor irmos. – Felícia segurou em minha mão me puxando para a saída. – A Anita é meio chata mesmo.
Senti uma sensação calorosa enquanto a Felícia segurava em minha mão. Algo diferente e inesperado.
1 SEMANA DEPOIS...
- Lucas, depois das às aulas vamos ao shopping? – era a primeira vez que o Iann me chamava.
- Legal. – abri a lata de coca, bebendo um gole. – Quem vai?
- A galera toda. – ele mostrou o visor do notebook com os últimos lançamentos do cinema.
- E ai? – A Felícia apareceu de surpresa atrás de mim. – Você vai?
- Tem uns filmes legais, acho que vou sim. – ela sorriu e sentou-se ao meu lado.
As amigas dela nos cumprimentaram e colocaram as bandejas do almoço junto ao Iann.
- O Hugo e o pessoal do futebol também vão. – ele comentou. – O que acha hein, Gabi, Patrícia!
As garotas não se conteram lançando pequenos gritos de excitação.
- Fiquei sabendo. – Felícia abaixou a cabeça e pisou em meu pé.
- E porque não disse nada? – a Patrícia questionou.
- Só por isso. – Felícia apontou a reação exagerada.
- Você sabe por quê... – ela ficou envergonhada de falar na nossa frente.
- Todo mundo sabe que você gosta do Hugo, mas eu só posso dizer uma coisa. Não é a única. Entra na fila – o Iann resolveu se intrometer. – Nem precisa me olhar assim, hehehe! Só to falando a verdade.
Hugo era o astro do futebol da nova geração. Uma grande promessa, embora fosse problemático. De atitudes questionáveis dentro e fora do campo, ele causava furor por onde passava. Segundo os rumores e as manchetes de jornal, pegou metade das garotas do C. A., sem citar outras ilustres desconhecidas, frequentava todas as festas que podia mesmo em vésperas de jogo, arranjou mais brigas e discussões do que os gols que já fez em sua curta carreira.
- Cooper, cala a boca. – a Patrícia se segurou para não bater nele.
- Eu tenho que pegar um livro praquele trabalho de física, me ajuda Fel? – vi como a Felícia estava estranha e por isso achei melhor inventar uma desculpa para tirá-la dali.
- Certo. – ela saiu sem dizer nada.
- Joga fora pra mim depois. – pedi ao Iann para colocar meu lanche no lixo.
- Falô. – ele piscou maliciosamente.
***
Fomos ao terraço lateral para conversarmos sem interrupções.
- O que foi? – disse quando chegamos.
- Nada. – ela puxou o cabelo para detrás da orelha e evitou me olhar nos olhos.
- Não me parece isso. – ao tentar me aproximar, ela se afastou e evitou nos tocarmos.
Ficamos nessa por algum tempo, e acabei por desistir de fazê-la confessar seus sentimentos pelo Hugo e poder enfim me esquecer dela.
- Tubo certo. – ao me virar para ir embora, Felícia me abraçou pelas costas. – Fale quando sentir vontade.
- Ele disse que gosta de mim de verdade... – ela revelou o que eu suspeitava. – Não sei se acredito nas palavras dele.
Pelo longo histórico dele, seria difícil acreditar mesmo.
- Ele... Pareceu tão sincero. – mordi o lábio evitando responder.
Durante esta semana ficamos muito próximos e comecei a gostar dela, embora soubesse, Felícia me via apenas como amigo. Não forcei a barra, jamais faria isso.
- Fale com ele. – tinha de dar uma resposta a ela e isso foi o melhor que consegui pensar. – Só assim você pode acabar com suas dúvidas em relação a ele.
Ela pressionou nossos corpos e se soltou.
- Você tem razão. – ela segurou em minhas mãos e beijou minha bochecha. – Lucas, você é um amigão viu.
- Hum. – sorri para ocultar a insatisfação de jogá-la para outro cara. – Vamos?
- Vamos. – ela correu pelo saguão principal em direção a cantina e resolvi fazer o mesmo.
***
- Não acha melhor ir com a gente? – o Iann pegou a mochila e cutucou a Felícia. – Pra quê esperar a Gabi terminar de assistir aula?
- Vocês vão voltar aqui mesmo. – disse chateado. A conversa com a Felícia me deixou pra baixo. – Pelo menos faço companhia a ela.
- Então espera a gente na esquina. – o Iann saiu junto a Felícia e a Patrícia. – Só vamos deixar as mochilas e voltamos.
- Tá. – peguei meu DS lite pra me distrair.
Alguns minutos se passaram até o momento em que finalmente tudo mudaria.
- Ei! – ao me virar para ver quem era, recebi um soco potente, acertando em cheio a minha testa, lançando-me no meio fio.
O formigamento em minha testa embaralhou minhas vistas, a confusão mental dando ânsia de vômito.
- Quê isso?! – disse confuso e apreensivo. – Ai minha cabeça. – vi o sangue escorrer e respingar no chão. – Por que fez isso?
- Pra não se meter com a mulher dos outros. – ao conseguir definir as imagens novamente, pude ver em extremo estado de fúria, Hugo avançar contra mim.
Tentei me levantar, mas senti tudo girar. Aproveitando que eu estava indefeso, ele desferiu uma joelhada em meu peito, deixando-me sem ar.
- Covarde! – a voz daquela garota me era familiar.
- Sai fora daqui, Anita, senão vai sobrar pra você. – Hugo disse ameaçadoramente.
- Você não me mete medo não. – ela levantou a voz contra ele.
Hugo acertou um chute em minhas pernas, me fazendo rolar para perto dos carros indo para o rumo da Anita.
- Hugo... – Felícia e Iann apareceram, presenciando uma cena deplorável. Ela parecia estar em estado de choque, sem saber se os seus olhos lhe mostravam a verdade.
Ao vê-la, Hugo se sentiu acuado e correu sem rumo.
Perturbado, ele não viu o carro passar, batendo de encontro ao vidro, arrancando-lhe sangue do abdômen e caindo no chão desacordado.
O motorista desviou do corpo inerte de Hugo, fugindo dali. Em um segundo eu era a vítima, mas a roda girou e os papéis se inverteram.
- Ajudem ele. – me arrastei para perto de Hugo ao ver que todos estavam perplexos para fazer qualquer coisa agora.
Somente uma garota de cabelo castanho se aproximou para me ajudar a tirá-lo do meio da rua. Aos poucos todos vieram socorrê-lo, já recuperados do susto inicial.
- Zuuuuumm! – um brilho forte transpassou nossos corpos. O calor inundou meu coração, aquecido, pulsante e acelerado, parando de bater neste plano.
A luz ardente nos consumiu.
***
- Isso é real? – disse um pouco indeciso e duvidoso de meus olhos.
- Depende do que você considera real? – recebi como resposta outra pergunta bem mais imprecisa do que a minha, mas de certa forma empolgante.
Globos de luz verde pairavam a nossa volta irradiando-se em fótons amarelados e incandescentes. O piso de metal frio e negro, a atmosfera vazia, mais leve. Ainda estávamos na Terra? Não conseguia imaginar ou pensar onde estávamos ou o que estava se passando. Um rastro de luz nos capturou e nos lançou em uma história perfeita de ficção científica.
- Forasteiros, devo presumir. – um homem que pelas suas características descendia do oriente se aproximou. Trajava roupas muito estranhas fora do convencional.
- Onde estamos? – a garota de cabelo castanho se antecipou a mim.
- In série. – ao ver que não fazíamos ideia daquilo, acabou rindo. – Vocês são nuklats. Há muito não apareciam aqui. – ele olhou para mim e o Hugo analisando nossos ferimentos. – Sou conhecido nestas terras como Kaze. Irei responder todos os questionamentos de vocês, mas primeiro devemos cuidar dos feridos. Pode atrair certos abutres se ficarem assim.
Felícia ajoelhou-se, escondendo o rosto em seu cabelo dourado para não mostrar suas lágrimas. Iann não conteve seu deslumbramento e entusiasmo. Anita segurou um globo iluminado sem saber em que mais acreditar. A garota de cabelo castanho estava calma e ao menos não demonstrou estar abalada. Eu segurava o corpo de Hugo, procurando manter a mente aberta para não enlouquecer e entrar em pânico.
Próximo capítulo:
Capítulo 02 - O princípio e o início
"Esqueçam tudo que aprenderam até aqui, não passa de lixo."